quarta-feira, novembro 17

O anseio da volta pra querência

Lembrando das aulas de marketing, uma das necessidades do ser humano é a pertença, sentir-se de algum lugar, de um grupo, uma comunidade ou local. Esse é, talvez, o mais simbólico dos desejos, porque não é material, não se iguala nem às necessidades básicas de alimentação, nem aos supérfluos luxos. É uma necessidade que tem significado único para cada pessoa, pois cada um sabe de que grupo quer fazer parte, a que local prefere pertencer. 
Vitor Ramil na sua tradução desse anseio
A cidade em que nascemos é por excelência o nosso lugar de pertença. Tudo que sai dali, mesmo que de qualidade duvidosa, adota pra nós um significado superior. É como se a origem por si só fosse um atestado de que erros não podem ser atribuídos àquilo. Faz sentido, já que saímos de lá, é também a nossa origem, e ninguém quer a atribuição de erros, defeitos. É como me sinto em relação ao Alegrete, terra mágica que cada vez que eu revejo, parece estar ainda mais bonita, mais perfeita. É estranho, mas até os imperfeitos bancos de areia nas margens do rio parecem estar lá não por obra do acaso, mas encaixados sabe-se lá por quem só para que as crianças possam jogar futebol nas tardes de horário de verão, em que o sol se põe às 21h30, indo dormir nas águas do Rio Ibiraputã. Sim, alegretenses crêem nisso.

Outra dimensão desse desejo de fazer parte de um lugar vem pela via contrária. Surge como reflexo, quando vemos que tudo o que precisamos, tudo que nos agrada, nos faz sorrir sem esforço, está em um lugar. Nesses lugares, os parques são como gostamos, o som das ruas parece ser sempre música, as pessoas - mesmo as feias - tem traços que nos fazem sorrir. Às vezes o nível de pertença para com esse lugar é tão algo, que até a violência, comum a todas as regiões povoadas atualmente, parece mais previsível e remediável. A literatura nos faz lembrar daquilo que até o mais dos altruístas quer ver como objeto de um livro: nós mesmos. O acolhimento de Buenos Aires é o que me faz sentir assim. Todos os meus mais internos desejos podem ser expressos na seguinte frase: 
da esquina da Calle Bolívar com Cochabamba, caminhando até a Plaza de Mayo; uma passadinha em algum café do começo da Defensa, seguido de passeio pela reserva ecológica onde a metrópole encontra o verde e o Rio de la Plata. Pronto, se algo me acontecer agora, pouco importa, estou completo.
A querência é, mais do que o lugar onde fomos paridos, o lugar onde nos sentimos no ventre...

2 comentários:

  1. Impressionante, um dia ainda escrevo assim, tive meus sentimentos retratados em teu texto. Isso é mais do que talento é um dom. Parabéns

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